A acne é uma das doenças de pele mais comuns, especialmente em adolescentes, embora também possa aparecer na idade adulta. Embora costumemos associá-la à «pele oleosa», hormonas ou stress, a verdade é que a acne é uma patologia multifatorial: intervêm fatores hormonais, genéticos, ambientais, inflamatórios, o estilo de vida e até mesmo a microbiota intestinal.
Nos últimos anos, evidências científicas demonstraram que a alimentação pode influenciar diretamente o aparecimento, a gravidade e a evolução da acne. Neste artigo, explicamos de forma simples como a acne se desenvolve, por que alguns alimentos a agravam e quais mudanças nutricionais podem realmente ajudar a melhorar a pele.
O que é acne vulgar?
A acne vulgar é uma doença da unidade pilossebácea. Ela aparece quando o folículo fica obstruído por sebo, queratina e bactérias, gerando lesões como:
- Comedões fechados (pontos brancos)
- Comedões abertos (pontos pretos)
- Pápulas (elevações inflamatórias e dolorosas)
- Pústulas (com pus)
- Nódulos (profundos e duros)
- Cistos (inflamatórios, dolorosos e com conteúdo espesso)
- Cicatrizes
É uma doença que se manifesta em surtos e tem um forte componente inflamatório.
Como se forma a acne? A fisiopatologia por trás das lesões
Vários processos ocorrem simultaneamente:
1. Hipersecreção sebácea
O excesso de sebo é influenciado por hormonas androgénicas, insulina e um aumento do IGF-1. Este último inibe o fator FoxO1 e ativa a via mTORC1, que estimula a produção de sebo e a proliferação de células na pele.
2. Obstrução do folículo
A hiperproliferação de queratinócitos e a sua aderência obstruem a saída do sebo.
3. Proliferação de Cutibacterium acnes
A falta de oxigénio dentro do folículo obstruído e a abundância de sebo favorecem a multiplicação da bactéria.
4. Inflamação
O sebo oxidado, os ácidos gordos livres e a resposta imunitária amplificam a inflamação, gerando lesões mais dolorosas e persistentes.
Hormonas e acne: a conexão que não podemos ignorar
As hormonas-chave no acne são:
- Androgénios: aumentam o tamanho da glândula sebácea e a produção de sebo.
- Insulina e IGF-1: potenciam a proliferação celular, a síntese de lípidos e a conversão da testosterona na sua forma mais ativa (DHT).
- CRH e melanocortinas: libertadas em situações de stress, agravam a inflamação.
Além disso, existem fases ou situações hormonais que aumentam o risco de acne:
Síndrome dos ovários policísticos (SOP)
Muito relacionada com a resistência à insulina e o hiperandrogenismo.
Acne adulta, perimenopáusica e menopáusica
A queda dos estrogénios, a resistência à insulina e o predomínio relativo dos androgénios favorecem os surtos.
O papel da alimentação na acne
A dieta influencia a acne porque pode:
- Aumentar ou reduzir a inflamação
- Alterar a microbiota intestinal
- Modificar a produção hormonal
- Afetar os níveis de insulina e IGF-1
Estudos populacionais demonstraram que sociedades não ocidentalizadas praticamente não apresentam acne… até adotarem uma alimentação rica em alimentos ultraprocessados, laticínios e açúcares.
Alimentos e hábitos que agravam a acne
1. Dietas com alto índice glicémico
Os alimentos que elevam rapidamente o açúcar no sangue aumentam a insulina e o IGF-1, favorecendo:
- Mais sebo
- Mais androgénios livres
- Mais proliferação de queratinócitos
- Pior inflamação
Incluem-se aqui: pão branco, bolos, cereais açucarados, refrigerantes, batatas, arroz branco, massas refinadas.
2. Laticínios não fermentados (especialmente desnatados)
O leite:
- Aumenta a insulina (mesmo com baixo IG)
- Fornece IGF-1
- Ativa mTORC1
- Contém proteínas (caseína e soro de leite) que disparam a insulina
O leite desnatado apresenta maior relação com o acne do que o integral.
3. Excesso de gorduras saturadas e trans
Uma dieta rica em ómega-6 e pobre em ómega-3 favorece o ambiente inflamatório da pele.
4. Chocolate com leite ou açúcar
O problema não é o cacau, mas sim:
- açúcar
- leite
- gorduras adicionadas
O chocolate preto com alta percentagem de cacau não apresenta este efeito.
5. Excesso de leucina e glutamina
Presentes em suplementos de proteína de soro de leite e em grandes quantidades de carne → ativam o mTORC1.
6. Álcool
Aumenta a testosterona, piora a microbiota e pode favorecer o desenvolvimento bacteriano na pele.
Alimentos e nutrientes que melhoram a acne
1. Ómega-3
São anti-inflamatórios, reduzem o IGF-1 e regulam a produção de sebo.
Peixe azul, sementes de linhaça, chia, nozes.
2. Vitaminas essenciais
Vitamina A: regeneradora e antioxidante
Vitamina C: cicatrizante e antioxidante
Vitamina D: baixa em pacientes com acne; reduz o sebo e o C. acnes
Vitamina E: antioxidante e anti-inflamatória
Vitaminas B: regulam a secreção sebácea (exceto B12 em excesso)
3. Minerais
- Zinco: bacteriostático e anti-inflamatório
- Selenio: regula o sebo e reduz o stress oxidativo
4. Chá verde
O composto EGCG inibe mTORC1 e SREBP-1, diminuindo a produção de sebo.
5. Probióticos
Restaurar a microbiota, regular a glicose, reduzir os androgénios livres e aumentar a SHBG. Especialmente úteis Lactobacillus acidophilus e L. rhamnosus.
6. Alimentos antioxidantes
A dieta mediterrânica é a mais rica neste grupo: frutas, legumes, leguminosas, AOVE, sementes, frutos secos, peixe azul.
Estratégias nutricionais que ajudam a melhorar a acne
1. Dieta de baixo índice glicémico
Reduz:
- tamanho das glândulas sebáceas
- produção de sebo
- lesões inflamatórias
- SREBP-1
É uma das intervenções com melhores resultados.
2. Dieta cetogénica
Melhora a inflamação e a sensibilidade à insulina. Não é necessária para todos, mas pode ser útil em alguns casos.
3. Dieta com baixo teor de carne
Reduz o aporte de leucina e outros aminoácidos que ativam o mTORC1.
4. Dieta rica em antioxidantes
Neutraliza os radicais livres e reduz a inflamação, algo fundamental no acne.
Conclusão
Embora o acne seja multifatorial, hoje sabemos que a alimentação influencia o seu desenvolvimento e evolução. Reduzir o índice glicémico da dieta, limitar os laticínios não fermentados, equilibrar o consumo de gorduras, aumentar os antioxidantes e melhorar a microbiota pode fazer uma diferença real na pele.
Por isso, a intervenção nutricional personalizada é um excelente complemento ao tratamento dermatológico convencional, permitindo abordar a raiz hormonal, metabólica e inflamatória da acne.



